Amor, fé e vontade

A história de uma rainha que há anos luta pelo Congado
Por Mairon Túlio

O ano de 1943 foi marcante: o Brasil entrava em definitivo na Segunda Guerra Mundial, depois de uma posição ambígua da ditadura de Getúlio Vargas em relação à aliança nazista. Mas não foi só a entrada do Brasil na guerra e a criação da FEB (Força Expedicionária Brasileira), que marcaram aquele ano: em 1943 nascia Janis Joplin, cantora-ícone que marcou a geração libertária hippie internacional dos anos 1960 e, em Itaúna, a luta pela liberdade dos negros brasileiros ganhava um símbolo, com a com coroação da rainha Maria da Conceição de Jesus no Congado da cidade.

Maria da Conceição, a Dona Sãozinha, é importante demais para a história do congado do Centro-oeste mineiro - e ao mesmo tempo é uma figura simples, simpática, como que reconhecendo o seu papel. Sua casa externamente é como ela, mas só para aqueles que não sabem explorar a riqueza de suas lembranças. A partir do momento que se entende a história de vida da congadeira, a casa simples, com telha de amianto, se transforma em um palácio, com rainha, recordações e objetos utilizados na festa folclórica. A coroa usada na coroação de 1943 ainda está junto aos pertences da rainha, misturada a objetos e imagens santos católicos.

O Congado em Itaúna inicia as festividades a partir do dia 15 de agosto, entretanto, para Dona Sãozinha, essa manifestação de fé e resistência cultural não ocorre apenas durante um mês. Está presente desde o ano de 1943. Ela diz que não sabe explicar o Congado, que é uma pessoa sem estudos, mas que ele é sim uma coisa de família. Uma tradição que vem desde seus pais. “A gente passa muita dificuldade com a festa, mas, com muito amor e fé, todo ano participamos.”

Com ajuda de outras “guardas”, grupos de congadeiros, Dona Sãozinha e sua família fazem com que a festa em Itaúna não desapareça. Seu genro César Luís Mara lembra que já passaram por muitos problemas na organização. “Quando havia pano para fazer as roupas, tínhamos que fazer com saco de linhagem. Conseguir ajuda não era muito fácil”, diz César Luís

Ana Maria de Rezende, formada em História, afirma que o Congado está perdendo muito de sua força atualmente. Para ela, só continua a ocorrer graças exclusivamente aos congadeiros, que lutam por manter essa tradição em cada cidade. Porém, a ajuda começa a apontar no horizonte. César diz que, agora, a Prefeitura colabora, o que facilita a festa na cidade. A rainha itaunense, junto com o genro, lembra ainda a participação de outras cidades como Carmo do Cajuru, Itaguara, Azurita e Betim. "Já tem uns 23 anos que ajudamos na festa de São Benedito, em Aparecida do Norte, que conta com a participação de muitas cidades de Minas Gerais e São Paulo.”

O Poder Público e sociedade civil organizada do Centro-Oeste ainda ajudam com o Prodescom, Programa de Desenvolvimento Sustentável do Centro Oeste Mineiro. Desde 2001, é um dos responsáveis pela cultura, economia e pelo social da região, e tem a função de busca soluções para as necessidades e desejos das comunidades visando ao desenvolvimento e melhorias da qualidade de vida do Centro-Oeste mineiro. Classificado como uma organização não governamental, o Programa propõe um plano de desenvolvimento regional com prioridades e objetivos a serem atingidos até 2010.

O Coordenador de Cultura do Prodescom, Dalton Miranda, explica que a iniciativa busca ajudar a cultura da região. “A partir das necessidades que detectamos, procuramos desenvolver projetos para saciar e sanar as carências, valorizar e fomentar toda potencialidade encontrada nas cidades do Centro-oeste mineiro.”

Embora seja um plano ainda bastante etéreo, não se pode dizer que o Prodescom é ineficaz. Basta verificar a opinião de Miranda, que, como a historiadora Ana Maria, diz que uma política para o Congado é importante, porque se trata de uma marca da região. “Em algumas cidades existem as guardas, em outras existem as cavalhadas, em algumas a festa tem mais renome, em outras são menos luxuosas, mas todas são congado”, diz Dalton. Com ou sem o apoio de políticas de apoio, no entanto, o Congado vai continuar a ser uma manifestação de fé, orgulho e esperança de um povo, cuja luta vem de muito antes daquele 1943.

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