Por Lidiane Medeiros e Mairon Túlio
No dia 20 de novembro o Brasil comemora o “Dia da consciência negra”. Em várias cidades do país há manifestações e festas, para tentar conscientizar aqueles que ainda não caíram em si de que ser humano tem cor e coração, não tem raça. Ou, como nos lembra Gilberto Gil em sua canção, “a raça humana é uma semana do trabalho de Deus.”
A data pode parecer nova no calendário de alguns, mas já se vão 37 anos de comemorações. Em algumas cidades do país, como Itaguaí, no Rio de Janeiro, a data significa possibilidade de descanso: lá, o 20 de novembro é feriado facultativo. A cidade maravilhosa foi a primeira do país a adotar o feriado de Zumbis dos Palmares, esse que foi peça fundamental na resistência dos escravos na época da escravidão. A data foi escolhida, pois marca a morte de Zumbi, no ano de 1695, aos 40 anos.
Marcelo Luiz, 33 anos, curtiu o feriado em Itaguaí e, diferente de outros tantos, sabia extamante o que estava sendo comemorado. De acordo com o encarregado de planejamentos, por lá, muitos questionavam o "por que era feriado?'”
Marcelo não participou e tampouco foi informado de manifestações, mas acha importante a folga. “Talvez seja uma forma de o preconceito racial começar a ser abolido. O feriado, sendo nacional, ajudará a acabar com o racismo no Brasil”, raciocina.
Na cidade de Itaúna, Minas Gerais, não houve feriado, mas o dia foi marcado por exposições e amostras da cultura afro-brasileira. A peça “O Despertar da Consciência Negra”, dirigida pelo dançarino Juliano Machado, que trabalhou com atores da 3ª idade na peça, foi uma das grandes atrações. Na praça central, houve exposições de arte, ligadas ao dia 20 de novembro.
João Paulo Moreira, 23 anos, é professor de ciências, história e geografia para alunos do ensino médio e fundamental em um colégio da cidade e acha que as atrações têm grande valor. “Fui a uma apresentação de capoeira, da qual meus alunos participaram. Eles fazem parte do Projeto 'Entre a Capoeira e o Caderno', do instrutor Filhote”, diz, se referindo a Denis Mariano, o instrutor da arte marcial brasileira. João Paulo acha que a data deve ser sim de feriado facultativo. “O feriado não faz com que as pessoas saiam de casa para ver as manifestações artísticas. Se houver um fomento para que as pessoas saiam de casa para isso, aí sim o feriado é uma boa pedida.”
Em Prado, na Bahia não é feriado e, segundo Bianca Nogueira, 18 anos, não houve nem manifestações. “O pessoal aqui na cidade tem muito preconceito racial, e, na maioria das vezes, racismo com eles próprios.” A jovem, que saiu de casa para conhecer o nordeste, afirma, revoltada, que a população da cidade não valoriza quem nasceu na região. “Por ser uma cidade turística, as pessoas que nasceram lá não se interessam por alguém que também mora ali. Mas é só aparecer um turista, que os interesses mudam.” Apenas para lembrar: a Bahia tem a maior densidade demográfica de negros brasileiros.
Faiçal Fernando, 28 anos, técnico de segurança na cidade de Juruti, no Pará, explica que, também em sua cidade, a situação envolvendo o racismo ainda é predominante. Para ele, não deveria existir o feriado de 20 de novembro, pois o negro não é diferente do branco. “Se fosse para existir um feriado, deveria ser um dia específico para lembrar apenas a escravidão no Brasil, o que a gente não pode esquecer, pois infelizmente, isso existiu no nosso país.” Para o técnico de segurança, outro exemplo de preservação da desigualdade que de fato existe são as cotas para negros em faculdades. O problema é saber, em uma sociedade em que o racismo não é, digamos, esclarecido, quando haverá de fato tal igualdade, de modo que as chamadas ações afirmativas sejam desnecessárias.
O Brasil tem o dia 20 de novembro como marco do sofrimento e resistência dos negros em um país cujas feridas da escravidão ainda estão abertas. Do ano de 2007 para o ano de 2008, mais 97 cidades incorporaram em seu calendário o dia da Consciência Negra como feriado – em 2007, eram 267. No total, hoje, são 364 municípios em 12 Estados brasileiros que têm no calendário um feriado a mais – o único, no entanto, feito para as lembranças da das lutas da população negra brasileira.