TRIÂNGULO AMOROSO: O CINEMA, A FICÇÃO E A MÚSICA


Daqui há um mês se comemora (ainda hoje) o aniversário de George Méliès, um dos cineastas mundiais com grande importância para a história do cinema. Isso não só porque seus filmes se tornaram clássicos na época de origem do cinema, mas sim pela nova perspectiva que o diretor trouxe. Méliès foi um dos primeiros cineastas a pensar o cinema, já em 1896, como uma forma de fantasiar o mundo, criar um universo que não seria possível na chamada “vida real” e não apenas filmar o cotidiano das pessoas, como era o caso da maioria dos cineastas de sua época.
O cineasta também é considerado um dos pais dos efeitos especiais no cinema, que já naquela época brincava com a dupla exposição dos filmes para criar efeitos até então inimagináveis, como o clássico rosto na lua.
A nova perspectiva de Méliès para o cinema é o que fez desta mídia o que ela é hoje: uma válvula de escape do mundo real – tudo é possível dentro do cinema, desde que o espectador se entregue à história.
Isso foi levado, posteriormente, para o mundo musical e sua própria arte de contar histórias em formato audiovisual. Não é difícil pensar em videoclipes musicais que contem alguma história intrigante, assim como no cinema. Entretanto, alguns músicos vão ainda além dessa ideia e pedem licença poética aos grandes mestres do cinema para recontar suas histórias em seus videoclipes.
Um primeiro exemplo foi a releitura do filme mais importante do próprio Méliès, o Viagem à lua, que ganhou uma versão um tanto quanto fiel à obra original, por Billy Corgan e sua trupe do Smashing Pumpkins em Tonight, Tonight. O videoclipe de 1996 simula os mesmos efeitos utilizados por Méliès para criar a ilusão da lua com rosto humano. Para além disso, o clipe traz um novo elemento para o filme: as cores, que na época de Mélies ainda não existiam no cinema.





Já Stanley Kubrick, um dos mestres das esquisitices e suspense no cinema, ganhou adaptações de dois de seus clássicos do cinema nos videoclipes. O primeiro deles foi o clipe de The Universal, da banda Blur, gravado em 1995, que faz referências ao filme Laranja Mecânica. Os músicos se vestem como os personagens do filme - com direito à maquiagem em apenas um dos olhos por Damon Albarn (vocalista da banda) que faz analogia ao protagonista do filme, Alex. O clipe se assemelha às cenas em que os personagens do filme se encontram no Milk Bar. O domínio da cor branca nas cenas é o mesmo entre o filme e videoclipe.





A outra obra de Kubrick adaptada para os videoclipes é O Iluminado, um dos clássicos de terror do diretor, que é adaptado em The Kill (Bury me), pela banda 30 Seconds to Mars. Algumas cenas do clipe são idênticas ao filme, sem falar na direção de fotografia que parece, de fato, ter pertencido à equipe de Kubrick. Até mesmo a utilização de letreiros é a mesma. A brincadeira com o nome da música (o assassinato) fica para quem já assistiu a obra original.




Mais uma adaptação de um dos mestres do cinema para o mundo musical é Um corpo que cai, de Hitchcock. A banda Franz Ferdinand foi a responsável pela releitura, no clipe Walk Away. Tarefa um tanto quanto difícil, uma vez que o diretor é um dos marcos do cinema mundial por sua sensibilidade na escolha de planos e movimentos. Entretanto, já na primeira cena do clipe a banda mostra o que aprendeu com o cineasta: a utilização de movimentos de câmera que giram em 360º - elemento clássico e inovador de Hitchcock.





A última releitura é a de um verdadeiro conto de fadas da história do cinema: O Mágico de Oz. O filme teve sua fantasia adaptada no clipe de Time is ticking out, da banda The Cranberries. O cenário de flores vermelhas, girassóis, grama verde e montanhas é o mesmo da obra infantil. As técnicas de filmagem também são bastante assemelhadas: durante a caminhada da trupe da banda pelo jardim fantasioso, com a câmera parada e os personagens andando numa espécie de esteira, e os planos de detalhes dos passos dos músicos.





Estes são alguns exemplos de que o cinema, a ficção e a música sempre tiveram um caso amoroso, com uma pitadinha de Méliès. Alguns manifestam explicitamente esse amor, outros fazem de tudo tentar separá-los.

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