O CONTADOR DE HISTÓRIAS

Comunicador formado na escola da vida, Cleuton 
Sampaio de Melo é exemplo de coragem e determinação


Cleuton hoje, aos 74 anos
      É sentado na varanda de sua casa simples, na cidade de Pitangui, que Cleuton Sampaio de Melo relembra a sua vida e suas experiências. Publicitário, designer, produtor e diretor de TV, ele possui um currículo vasto de uma carreira de mais de 50 anos. Com sua fala mansa e um sotaque de cidadão do mundo, ele conta os caminhos que o trouxeram à essas terras mineiras. “Eu tinha um projeto de vida. Quando atingisse 65 anos, passaria a viver numa pequena cidade”,diz. Pitangui foi escolhida por ser a terra natal de sua esposa, Lúcia.  Seu plano era melhorar a qualidade de vida e morar numa casa simples, onde pudesse manter um jardim e ter contato com a terra. Esse, aliás era um requisito importante, pois havia morado mais de 40 anos em um apartamento, na cidade do Rio de Janeiro.
       Embora tenha sido, como ele diz, “adotado” pelo Rio de Janeiro, Cleuton nasceu em 1934, em Capela, uma pequena cidade ribeirinha às margens do rio Paraíba, em Alagoas. “Sobreviver era teimosia. Sou teimoso.”, brinca, fazendo menção à alta taxa de mortalidade infantil da região, sobretudo por esquistossomose. Quando tinha apenas cinco anos de idade, se mudou com seus pais para Garanhuns, uma cidade serrana de Pernambuco. Lá, quando menino, já demonstrava desenvoltura e talento para a comunicação, fazendo apresentações de música em circos como cantor e percussionista, além de fazer as orações das 18 horas numa rádio improvisada em um serviço de alto-falantes. 
Cleuton aos 19 anos - tempo em que
apresentava o programa "páginas do sertão"
        Cleuton, também gostava bastante de desenhar e pintar letreiros e chegou a montar uma oficina para produzir placas. Criava também mamulengos  - fantoche, típico do nordeste brasileiro - e bonecos de papelão para vender em várias feiras no interior junto com seu pai, que comercializava tecidos. E dessas viagens Cleuton viu surgir mais uma de suas paixões, a poesia. “Comecei a me interessar por registrar a riqueza da linguagem em versos. Passei a escrever poemas, conhecidos como poemas sertanejos e me transformei num declamador, poeta do sertão”, relembra. Com essa nova experiência, mais tarde chegou a ter um programa de rádio, na rádio difusora de Alagoas, em Maceió, chamado “Páginas do sertão”.
 Mas apesar de seu gosto pelas coisas do nordeste, Cleuton sempre teve um sonho: ir para o Rio de Janeiro. “Eu acreditava que lá poderia ter uma melhor oportunidade para aprender, trabalhar e crescer”, desabafa. “Meu pai queria que eu ficasse para ajudá-lo na loja e nas feiras. Ele disse: "Se você quiser ir embora, não vou impedir, mas lhe darei somente o dinheiro da passagem de ida”. Com apenas 19 anos Cleuton partiu sozinho de navio rumo ao Rio de Janeiro, sem conhecer a cidade ou qualquer previsão de um local para morar. Precisava procurar emprego, e relembra as dificuldades que passou. “Imagine um retirante nordestino sem nenhuma orientação, andando só pelas ruas do Rio de Janeiro procurando emprego. Não sabia nem por onde começar.”
        Ingênuo, pensava que conseguiria trabalhar numa emissora de rádio e chegou a fazer um teste na Rádio Nacional. “Nem terminei, mandaram procurar outra coisa”, relata. “Como já tinha pintado placas e letreiros em Garanhuns, consegui o meu primeiro emprego no Rio como pintor de cartazes de cinema”, acrescenta. Chegou a morar no porão do cinema Palácio na Cinelândia, dividindo o quarto com os ratos.
      Sempre curioso e expansivo, ao passar dos tempos e já em outro emprego, numa loja de departamentos, Cleuton começou a imaginar várias promoções que poderia fazer para atrair clientes. Aos 22 anos foi promovido a gerente de promoções. A partir do trabalho na loja, foi convidado para ser gerente de propaganda em Belo Horizonte. “Nesse período ganhei muita experiência com publicidade e propaganda, fazendo trabalhos também na televisão”, relembra. “Não havia escola nem faculdade de Comunicação, Propaganda ou Publicidade. As agências eram cercadas por uma forte corrente de profissionais que inibiam a entrada de novos interessados”, lamenta. “E eu tinha entrado pela porta dos fundos!”.
        Como profissional da área de comunicação, Cleuton trabalhou em outras agências, em outras empresas e participou de vários projetos grandes.  Ele relembra sua estréia como locutor do Autódromo Internacional do Rio de Janeiro e do Festival da Cerveja do Rio de Janeiro, uma festa para 18 mil pessoas. E afirma com entusiasmo: “O festival que realizamos foi pioneiro no Brasil e serviu de exemplo para todos os outros festivais”. Foi também produtor de um programa de televisão que ficou no ar durante três anos na rede Globo, “Amaral Neto, o repórter”.
       Em 1975, Cleuton criou uma empresa para trabalhar com projetos de comunicação dirigida, conhecido hoje como Comunicação Empresarial. Com isso, viajou por todo o país e por uma boa parte do mundo para realizar o seu trabalho onde o cliente tivesse interesse. “Eu viajava muito, terminei conhecendo quase todo o Brasil e uma boa parte do mundo. Andei pela Dinamarca, França, Estados Unidos, Itália, Portugal, Jordânia, Síria, Iraque e cheguei a montar um escritório em Angola, na África”, relembra.
Os dois livros lançados por Cleuton em 2011
     Quando se mudou para Pitangui, já estava cansado da rotina estressante de trabalho a que havia se submetido. Era hora de diminuir o ritmo e cuidar da saúde. Mesmo assim não ficou parado. Continuou trabalhando em empresas locais com a comunicação empresarial e como designer e assessor de comunicação. Seus conhecimentos foram muito bem vindos na cidade, a ponto de, em 2006, a câmara de vereadores o presentear com o título de cidadão honorário, pelos relevantes serviços prestados ao município. 
      Por sua imensa bagagem de histórias vividas ao longo de seus 74 anos, resolveu lançar dois livros em 2011: “Mamulengos, histórias de um cidadão sonhador”, uma autobiografia e “A briga do calango com a cobra: Mineiridades pitanguienses”, onde reúne crônicas e causos das suas experiências na cidade de Pitangui. “Mas não sou escritor, sou mais um contador de histórias”, enfatiza Cleuton. Um contador de boas histórias.
Por Renato de Faria e Mariah Vianna

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