A internet ainda consegue nos surpreender. Dizem por pura brincadeira que só somos alguém quando nosso nome é reconhecido durante uma busca pelo Google. E na falta do que fazer em um domingo qualquer, resolvi pesquisar o que o Google tinha a dizer ou a denunciar sobre mim.
O teste começou com o meu nome completo: Júlia Carolina Medeiros. As buscas não foram nada animadoras. Daí pensei: quer dizer que para esse site ainda não sou ninguém? Mas resolvi insistir, e troquei a busca por “Júlia Medeiros”, nome que uso desde que entrei na faculdade, e que escolhi para ser minha assinatura e marca na profissão.
Na primeira página de busca, encontrei alguns perfis de redes sociais, como facebook e twitter, umas imagens estranhas, e fui seguindo, já sem muita esperança. Para tentar encontrar qualquer sinal de que eu faço parte desse universo, resolvi apelar ainda mais, refinando a busca para “Júlia Medeiros Divinópolis”. E veio o que eu tanto esperava: uma resposta positiva sobre a minha existência!
Encontrei o registro de alguns trabalhos que fiz para as oficinas de Jornalismo na faculdade, reportagens do tempo em que trabalhei como repórter no Jornal Agora, minha inscrição em um concurso do qual eu nem lembrava e ainda traz o número da minha identidade e outras coisas! Eles podem fazer isso?!
Ainda nos “achados”, descobri que no estado do Pará, no município de Ananindeua tem uma rua chamada Júlia Medeiros. Mas a principal descoberta foi sobre outra Júlia Medeiros; homônimo que me despertou a atenção quando vi um arquivo em PDF com os dizeres que minha xará era “uma mulher a frente do seu tempo". A partir daí, a curiosidade em descobrir quem era aquela Júlia Medeiros, o que ela havia feito de tão importante falou mais alto, e então comecei a pesquisar sobre ela, e não mais por mim, Júlia Medeiros, de Divinópolis.
A surpresa foi a das mais surpreendentes. Júlia Medeiros foi uma grande jornalista, pioneira na profissão e na Educação em Rio Grande do Norte durante a década de 20. Seu nome completo é Júlia Augusta Medeiros, e é um pouco da história dela que divido com vocês.
Sua assinatura também era Júlia Medeiros. Jornalista de idéias feministas, já em 1920 defendia o papel da mulher na sociedade. Formada em Pedagogia, Júlia Medeiros demonstrava sua paixão pelo Jornalismo ao escrever para os pequenos meios de comunicação da cidadezinha de Caicó, município onde nasceu. Pela Revista Pedagogium, publicou em 1925 o artigo “A missão da mulher”, onde questionava o papel da mulher na sociedade. Em um dos trechos, ela dizia: “A missão da mulher poderá se estender além do lar, cujo programa será sempre a dedicação, não procurando vencer senão pela virtude, visando que a nossa força e o nosso prestígio representam a modéstia e as delicadezas inerentes ao próprio sexo”.
Com a criação do Jornal das Moças, em 1926, Júlia Medeiros se tornou colaboradora e redatora. O Jornal era publicado semanalmente, e continha apenas temas de interesse as mulheres, como curiosidades da cidade, artigos e crônicas, pensamentos, poesia, acontecimentos de Caicó, questionamentos da mulher na sociedade, e ainda dedicava espaço para a divulgação de correspondências, onde mulheres agradeciam a existência do Jornal, e defendiam a criação de um jornal feminino, já que o grupo de colaboradores era composto em sua maioria por mulheres. O Jornal circulou até 1932.
Júlia se aposentou como professora em 1958, e depois fez sucesso na política, sendo vereadora por dois mandatos. A partir daí, sua história nunca mais foi à mesma. Com problemas de memória, e perturbada mentalmente, foi levada pela família até Natal, onde teria mais condições de tratar a saúde.
O orgulho falou mais alto, e ela nunca aceitou ajuda. Morou sozinha de frente ao Rio Potengi, na Rua Misericórdia, e por ali, teve um final de vida bem triste. De grande professora, e pioneira no Jornalismo no Rio Grande do Norte, Júlia Medeiros virou mendiga, catando lixo e restos de comida e coisas podres nas ruas. Assim, ficou conhecida por outro nome: Rocas-Quintas, apelido que referencia os bairros por que ela, já sem lucidez, caminhava todos os dias.
Júlia Medeiros morreu sozinha aos 76 anos, no dia 29 de agosto. Não como a grande pessoa que fez história na sua cidade, no estado, e principalmente no jornalismo, mas sim com a mendiga Rocas-Quintas.
Ficou curioso em saber o que o Google tem a dizer sobre você? Entre agora mesmo no site e faça uma busca pelo seu nome. Quem sabe não aparecer uma surpresa? Boa sorte!
Júlia Medeiros
Editora: Larissa Moura